Este é mais um daqueles textos que poucos vão ler, por conta da nossa tendência moderna de não lermos mais nada que ultrapassa as 300 palavras. Mas eu estou pouco me importando se vou ser lido daqui a um mês, daqui a um dia, ou daqui a um século por alguma alma abnegada de tempo, para desfrutar de uma simples opinião escrita numa madrugada insone.
Na verdade, tem muito blogueiro hoje que já não escreve sem pensar no padrão "Google" de ganhar audiência (eu sei que dinheiro é importante, mas também é importante o não ter dinheiro, uma vez que dinheiro não é tudo). Estou dentro do Google, porque o Blogger é um "terreno" dele e deveria seguir a tendência. Mas já que me está sendo dada a palavra escrita, vou pedir licença para não pensar numa linha de SEO para blogar.
Não era para eu ter iniciado desse jeito um artigo que não tem nada a ver com blogar. Quero falar de religião ocidental de matriz chamada cristã (não sei se a expressão existe, mas é que hoje é preciso ser politicamente correto até para falar de religião, já que ela também está dentro do relativismo...).
Não nego que nos últimos meses venho sentindo abalos em minhas convicções religiosas. Com isso, não pretendo dizer que quero me afastar de Deus, muito pelo contrário. É que quanto mais eu tento aprender o mínimo que seja do chamado cristianismo ou do chamado judaísmo, ou das divergências existentes nessa seara, mais me vejo como um ignorante.
Ultimamente, até a palavra pregada pelo pastor da minha denominação não vem me satisfazendo. Não pretendo ser mais um desigrejado, mas considero salutar beber em outras fontes, sempre que possível. Por não me sentir mais plenamente satisfeito em meu "ministério" sinto a necessidade de optar por uma linha de conduta, ao mesmo tempo em que sinto vontade de mudar de opinião, apesar das pressões externas, muitas vezes movidas por dogmas que se querem ser imutáveis (será que os são mesmo?).
É até difícil de explicar, por isso não quero embromar. Por exemplo, a questão do batismo da maneira pentecostal, que há nove anos vinha sendo convencido a acreditar que é o único válido. No fundo, nunca me senti convicto de que iria acontecer comigo. Já chorei, já senti Deus "falar" comigo de alguma forma em momentos diferentes da vida, mas nunca me senti capaz de exercer esse dom de falar "em glossolalia", como os pentecostais genuínos falam (ainda que de uma maneira diferente da que é retratada em Atos 2). Dessa forma, na doutrina pentecostal, eu nunca fui batizado.
A coisa do chip, das marcas de produtos ou de coisas como encontrar em todas as notícias do mundo uma mensagem subliminar de alguma forma de dominação ou arquitetacao ligada ao apocalipse. Sinceramente, há tempos que discursos nessa linha não são digeridos por mim.
A doutrina dos dízimos e ofertas, outro dilema. Por que tanto se diz que "negar para Deus" é ter uma espécie de amor ao dinheiro ou ser avarento ao máximo? Por que em vez deles dizerem que existe a obrigação do dízimo para Deus (como se fosse Deus que vai administrar as verbas), eles não são mais claros, tipo assim: "irmãos, precisamos pagar isso é aquilo, precisamos garantir o salário do nosso pastor, precisamos mandar dinheiro para um missionário na roça e quitar o Ipva do carro da igreja, por isso precisamos pedir aos irmãos que dêem"? Ou seja, até que ponto a escritura bíblica não está mesmo sendo usada para justificar a manutenção de um status quo de um certo "costume financeiro"? Não estou afirmando que dinheiro faz mal para uma igreja, não estou dizendo que o dinheiro é dispensável para alguns de nós. Não estou dizendo que todos são gananciosos. Mas por que as "obras de Deus" na terra não mudam essa forma de lidar com dinheiro? Será que é preciso pedir dinheiro a cada culto? Por que igrejas como aquelas similares à Universal e tantas outras não desaceleram um pouco esse tipo de doutrina?
Reconhecer que toda organização religiosa precisa se sustentar com verbas em multirão e reconhecer que alguns líderes dessas organizações precisam de sustento são uma coisa, não nego que as organizações precisam de capitalização. Mas insistir na tônica de "é preciso dar a Deus o que é de Deus" da forma como basicamente se percebe hoje, eu considero uma anomalia da religiosidade que se diz ser cristã. Eu considero uma aberração. Para que uma igreja precisa "bater meta"? Isso é coisa de "obra de Deus" ou empreendimento comercial? Por que não se multiplicam pastores que fundem igrejas que só peçam o mínimo para sobreviver? Por que Edir Macedo, RR Soares, José Wellington ou qualquer outro líder de "grandes rebanhos" (nem queria citar nomes para não acharem ser perseguição) precisam se tornar modelos de homens "empreededores"? Da forma como se entende ser empreendimento hoje, os cristãos precisam é de anti modelos...
A questão do cristianismo: será que nós, homens, inventamos um cristianismo do qual Jesus se envergonharia se estivesse hoje, corporeamente em nosso mundo? Parece que há uma compreensão latente de que Jesus veio para "acabar" com o judaísmo, como se o judaísmo estivesse em falha e se a solução para a salvação fosse o chamado cristianismo, que nem foi Jesus quem inventou... (Oh, meu Deus, que essa inquietação não seja reputada como rebeldia!).
Ademais, por que se prega tanto uma fé de resultados neste país? Por que esses que pregam resultados, que dizem que resultados requerem algo como o "sacrifício de isaque", rechaçam aqueles que desenvolvem um culto racional, mas efusivo no tocante aos dons de línguas "estranhas", aos "mantos de poder", ao gritar, saltar pular na unção? E rechaçam o viver ascético do homem na terra, o viver sem a sanha de virar empresário, mas se contentar em ser empregado?
As liturgias de cultos de matriz cristã: senta, levanta, repete, bate palmas, canta, dança, sapateia são tão valorizados para uns e tão abominados para outros.
As mudanças de igreja ou, sendo mais claro, a "rotatividade denominacional" (também não sei se a expressão já foi cunhada): tenho um amigo pastor que dizia sobre alguns daqueles que trocavam de placa denominacional: "se fulano mudou de igreja com a desculpa de que o Deus é o mesmo, isso não é bem verdade: mudou porque o Deus era diferente". Se me perguntassem o que eu acharia no tempo em que pensava assim, eu também consideraria um erro mudar de igreja. Hoje já me considero mais flexível a este respeito. Tanto que sou capaz de dizer (se fosse pastor): "Meu amigo, se está investigando os aspectos e sente no coração de avaliar uma outra placa denominacional, vá em frente, pegue sua carteira de membro ou sua carta e vá lá. Se quiser voltar e ficar conosco bom, mas se não, continuaremos bons amigos". Eu gostaria que os pastores mudassem de atitudes quanto ao "perder" ou "ganhar" ovelhas. Essa metáfora das ovelhas do pastor é poética, muitas vezes soa destoante demais, por isso precisamos aceitar os fatos. É como se membro fosse gado, que precisasse ser guiado pelo berrante ou pelo grito do dono ou do cuidador. Devemos ser ovelhas e respeitar o pastor, mas até aí. Ovelha não pode significar passividade, aceitação de tudo, só porque foi o pastor que está direcionando. Não é uma questão de rebeldia. É uma questão de simples bom senso.
Este é o pequeno resumo de algumas agonias religiosas pelas quais tenho passado. Sei que são somente o princípio de um processo e que não tem nada a ver com revolução dos costumes. Não estou querendo fundar nada, nem transformar uma experiência pessoal em mote para interromper o caminho dos outros. Que Deus abençoe a todos.