sexta-feira, 26 de abril de 2002

O desaparecimento de Lessia

O nome dela eu nunca pesquisei ao certo, mas o que eu tenho lembrança era Lílian Lessia. Certamente, não é este o correto, é uma lembrança vaga de ter ouvido as pessoas falarem e algum registro no crachá.

A outra lembrança forte que havia ficado foi um poema escrito numa folha de caderno que foi destacada do espiral, para passar a rodar por uns anos em locais diferentes, até sumir ou ser queimado. Desse poema eu só me lembro do primeiro verso (o resto que se segue é uma reconstituição de um trecho):

Lessia partiu,
Partiu, não chorei, não sofri,
Partiu sem dizer a que veio, a que vai
A não ser arrazar
Um coração

Partiu, não chorei, mas senti
Uma perda bandeiriana daquilo que poderia ter sido
E que não foi 

Lessia partiu, 
Ela não tinha o padrão:
Podia não ter bunda, mas tinha peitos
Podia não ter conhecimento, mas tinha o sorriso
Podia não ser feliz, mas aparentava
Podia ter o rosto enorme, desproporcional
Mas o coração não guarda proporções...

Partiu, não chorei, só senti
Hoje me sobrou a lembrança mesquinha
E o arrependimento

O poema como está não tem mais valor. Perdeu o viço, o calor, a angústia do momento. Perdeu o calibre que tinha e só está aqui para ocupar um espaço, que agora carrega o peso ruim de uma reflexão.

Tudo isso se passou nos idos dos anos 90. Não vou dizer que ela tenha sumido. Mas que desapareceu, isso sim. Merecia uma volta. Merecia uma reconsideração. Lessia partiu como chegou: do nada e de repente. Tinha ficado em mim outrora a sua lembrança do ginasial, no Polivalente, que mesmo assim, não era nada familiar, porque nunca fomos da mesma turma (nem no sentido de classe escolar, nem no sentido de "tribo"). Nada mais. Só paixão encubada.

Aliás, de paixão encubada eu entendia muito, durante pelo menos um pedaço da década que durou minha adolescência (10-17 anos).  Depois essas ilusões acabaram de vez, acho que foi muito bom para mim. E hoje eu fico achando graça (se não fosse trágico) dos otários que, com 9 anos, querem ser traficantes perigosos...

Naquela época, quando do acontecido, se tivesse que concluir esse episódio, eu talvez diria algo assim: "Mas tudo isso é pouco. Tudo isso prova o quanto nós somos frouxos de tomar uma decisão, quando mais se precisa dela".