Este post é o mais intimista, ou poderá ser, não sei...Também é o mais provinciano, ou poderá ser, não sei... Na dúvida, se você tem mania de globalização, ou se acha o paladino da imparcialidade, nem perca tempo lendo.
É comum dizermos que a tecnologia encurta as distâncias e diminui a saudade. Mas isto só é verdade para os vivos, sejam eles seres ou coisas. No caso dos mortos (desnecessário dizer? Vá lá: sejam eles seres ou coisas...) a tecnologia funciona de modo contrário: aumenta a saudade. Quando recuperamos digitalmente imagens daquilo que já se foi, essa segunda verdade é verdadeira ao quadrado. Até nossa memória fotográfica, um de nossos dons inatos, nos machuca, quando, por exemplo, nos reportamos mentalmente a um ente querido, recém-falecido...(no meu caso, são as memórias de Adriano, não o da Marguerite Yourcenar, que não li ainda, mas as de meu cunhado mesmo).
Que dizer das memórias fotográficas, tipo as produzidas por fotógrafos competentes como os do Clube Gerson Bullos? E que dizer quando essas memórias são de imagens digitalizadas e ampliadas de uma cidade que não existe mais, com aquele jeito provinciano de ser?
O cenário é o hall da Biblioteca Central Julieta Carteado. A cidade retratada - literalmente- é a Feira de Santana do século XIX e início do XX ("Feira de Santana. Uma viagem ao passado."). O veículo que nos transportou até ela: a tecnologia. Os personagens coadjuvantes: as famílias feirenses que tiveram a sabedoria de conceder imagens históricas para essa exposição. Os culpados por este post saudosista: os fotógrafos-restauradores do Clube de Fotografia. Pronto: esta é a composição de que neste dia eu necessitava para concluir que tenho saudades desta Feira de Santana.
Contemplar prédios, ruas e pessoas que não existem mais é uma experiência marcante. Lembro de que na minha infância tive a mesma experiência ao visitar o Museu-Parque do poeta Castro Alves, em Cabaceiras do Paraguaçu, onde tinha parentes e passei férias escolares na década de 80. Foi aquele museu que me fez devorar o ABC de Castro Alves todo em poucos dias. Quem já leu o livro de Jorge Amado sabe do que estou falando. Fora a sensação de saber que você não fez parte daquela história, ficou também a sensação de nem ser parte da história presente, esta que se constrói agora. É como se tudo aquilo, toda aquela aparência de cidade pacata, de lugar em que todo mundo se conhece, de ruas tão largas (ainda com vegetação!), de pessoas diferentes (embora em parte sendo as mesmas) fosse a versão boa de uma história sem continuação. Não dá para encaixar a Feira distorcida de hoje naquele quadro. Mexemos em tudo, no espaço dos pedestres, no espaço dos motoristas, prédios desnecessários foram erguidos à custa do apagamento de outros, hábitos de cidade pequena foram esquecidos para dar lugar ao medo da violência. Enfim, tomadas as devidas proporções quantitativas, o saldo é negativo, não obstante o elevado crescimento da cidade.
Fotografias antigas seputam o passado? Não, os mortos ficam se remexendo nos túmulos memoriais, mas isso não tem nada a ver com essas franquias de filmes de terror. A tecnologia da restauração das imagens trabalhou a nosso favor, mais uma vez. Na exposição do Clube de Fotografia, o feirense poderá ter noção do quanto a memoria de uma cidade é importante para a formação de sua identidade. Ao mesmo tempo eu me pergunto: qual a identidade de Feira hoje? O que esta cidade mercantil sabe de sua história recente e até que ponto esse saber é valorizado? Nossa identidade vai além do legado de tropeiros, vaqueiros, sertanejos, feiras livres e comércio efervescente. Essa exposição precisa ser montada fora do âmbito do hall da Biblioteca, ela precisa ir para as ruas de Feira, se possível, de forma intinerante. O povo de Feira precisa saber como era esta cidade. E repensar a Feira que temos hoje.
Fotografias antigas seputam o passado? Não, os mortos ficam se remexendo nos túmulos memoriais, mas isso não tem nada a ver com essas franquias de filmes de terror. A tecnologia da restauração das imagens trabalhou a nosso favor, mais uma vez. Na exposição do Clube de Fotografia, o feirense poderá ter noção do quanto a memoria de uma cidade é importante para a formação de sua identidade. Ao mesmo tempo eu me pergunto: qual a identidade de Feira hoje? O que esta cidade mercantil sabe de sua história recente e até que ponto esse saber é valorizado? Nossa identidade vai além do legado de tropeiros, vaqueiros, sertanejos, feiras livres e comércio efervescente. Essa exposição precisa ser montada fora do âmbito do hall da Biblioteca, ela precisa ir para as ruas de Feira, se possível, de forma intinerante. O povo de Feira precisa saber como era esta cidade. E repensar a Feira que temos hoje.
Dito tudo isso, concluo o post mudando o ditado: a tecnologia encurta as distâncias e aumenta a saudade.
Parece estranho, mas estou sentindo uma saudade sadia de um tempo em que não vivi. Bom seria se a tecnologia tivesse o poder de fazer voltarmos ao passado. Isso não é apologia ao passado nem abominação do progresso e muito menos "terapia" de vidas passadas. Isso é só o desejo de preservar a cidade do esquecimento.